Ela gosta de soltar a voz, tanto que já foi reconhecida como a grande diva do Soul Music. De voz potente, essa caxiense nasceu numa família de músicos, começou sua carreira aos 14 anos e integrou a Lucille Band, que considera sua escola. Ao comemorar 30 anos de carreira, seu maior projeto é não parar
Um ser em desenvolvimento é como Franciele Madalena Dornelles Duarte, mais conhecida como Fran Duarte, resume sua essência. Nascida numa família de músicos, a primogênita do baterista Francisco Rodrigues Duarte e da assessora parlamentar Marisabeth Dornelles Duarte começou a cantar ainda criança e, aos 14 anos, já acompanhava o pai nos carnavais pelo estado antes mesmo do irmão caçula nascer. Bolívar, que também herdou a veia artística, toca bateria e violão, e integra a banda Tragicômico.
O momento mais importante de sua carreira, aquele que balizou a direção dos anos futuros, aconteceu aos 17 anos, quando Fran passou a integrar a Lucille Band, que embalou a trilha sonora da vida de muitos caxienses na década de 1990. “Nada foi a mesma coisa depois daquele teste.” Desde lá, Fran já passou por muitas experiências e até pensou em não voltar ao Brasil quando participava de uma turnê. O motivo do retorno atende por Laura, filha da irmã, Marciele, e do cunhado/irmão, Gene Toscan, que esteva prestes a nascer. Hoje, aos 43 anos, a cantora de voz potente, que já foi chamada de diva do Soul Music, coleciona motivos para comemorar, entre eles, o lançamento do single Song For Me, trabalho autoral que, confessa, mais se identifica.
Você começou a cantar ainda na infância, como foi a descoberta para a música?
Venho de uma família de músicos, meu pai era baterista, meu avô tocava gaita ponto. Por isso, a música e o ambiente musical de ensaios e apresentações sempre foram muito presentes na minha vida. Ainda na infância lembro de cantar para os familiares. Já na adolescência, aos 14 anos, iniciei profissionalmente, ao lado do meu pai, cantando carnavais pelo estado. Acho que meu primeiro foi em Erechim. Mais tarde, aos 17, ingressei na Lucille.
Você se inspirou e/ou ainda se inspira em alguém?
Muito! Me inspiro em grandes artistas como Aretha Franklin, Janis Joplin, Elis Regina, Stevie Wonder, Clara Nunes... nossa são tantos. Mas também me inspiro em colegas de profissão, com quem troco experiências artísticas, com jovens que estão “iniciando” na carreira e que sabem tanto sobre coisas que eu não entendo, já que sou de uma geração em que a forma de se comunicar e ver o mundo era completamente diferente. Me inspiro com filmes, músicas, livros, com as pessoas e suas histórias de vida.
Você é reconhecida pela voz potente e já foi chamada de diva do Soul Music. Como define seu estilo?
Eu gosto de soltar a voz. Gosto de cantar com potência, com vigor. Me sinto viva, livre. Por isso a identificação com o Blues e a Soul Music foi imediata. Mas, como cantora e intérprete, incluo no meu repertório tudo o que me toca, me emociona.
Em 1995, você passou a integrar a Lucille Band, que gravou dois CDs e teve muita projeção em Caxias e região também nos 12 anos de história. O que esse período representou na sua carreira?
Entrei na Lucille por intermédio da Janaína Formolo, backing vocal da banda na época e minha colega no coral da Sociedade de Cultura Musical. Lembro de ir até a casa dela para um teste e cantar Me And Bob McGee, da Janis Joplin. Sem sombra de dúvida, foi o momento mais importante da minha carreira. Nada foi a mesma coisa depois daquele teste e tudo o que aconteceu após aquele dia foi por causa da banda. Foi minha escola, onde descobri a Soul Music e Aretha Franklin, entre tantos outros artistas que me inspiram até hoje. Viajei para várias cidades, cantei para um número de espectadores que nem consigo contar, me tornei artista. Mas, mais que isso, na Lucille conheci pessoas que levo pra vida toda. Amigos/irmãos que amo profundamente.
"Nada foi a mesma coisa depois daquele teste e tudo que aconteceu após aquele dia foi por causa da banda."
Você tem uma enorme bagagem e participou de todas as edições do Mississipi Delta Blues Festival, por exemplo. Como é essa experiência? E pretende estar na edição deste ano, que está prevista para acontecer nos Pavilhões da Festa da Uva?
Não é só participar do festival. É se deixar envolver de corpo e alma com o espírito do blues. A gente respira blues e suas vertentes durante os três dias de evento. O pessoal costuma dizer que é a Disneylândia do Blues. E eu só posso concordar. Espero muito estar no palco da próxima edição, porque presente certamente estarei.
Você participou como solista em orquestras, como a Mu-nicipal de Caxias do Sul, a Sinfônica da UCS e a de Sopros de Garibaldi. É diferente?
É diferente no que diz respeito a questões específicas, porque não existe muito espaço para improviso, já que está tudo escrito e um equívoco pode mandar uma orquestra inteira ‘pro mato’. E isso eu não quero, não (risos). Mas o preparo, os ensaios, a ansiedade pré show e a entrega durante a apresentação são na mesma intensidade. Sempre encaro todos os trabalhos com muito respeito e dedicação. O público merece isso.
Em 2012 você lançou seu primeiro CD solo, Sol Da Manhã, e, em 2013 e 2014, se apresentou em diversas cidades da Europa e Estados Unidos. Como foi esse trabalho?
Foi longo (risos)! Mas gratificante. Foi minha primeira experiência num trabalho só meu. Claro que contei com a colaboração de outras pessoas maravilhosas, mas era meu nome na jogada. Houve erros, coisas que faria diferente, aprendizado. Mesmo assim, o resultado foi espetacular e me orgulho muito desse trabalho. E, somado a isso tudo, a possibilidade de cantar fora do país não tem preço. Foram meses incríveis! Quase não voltei. Só voltei porque minha sobrinha, Laura, estava para nascer e eu não poderia perder esse momento.
Quais outros projetos você destacaria na sua carreira? Talvez a 20ª edição do Cosquín Rock, na Argentina, que contou com um público de 80 mil pessoas, em 2020?
São 30 anos de carreira em 2021. Eu vivi tanta coisa. Às vezes as pessoas me contam passagens desse período que nem lembro mais. Sim, o Cosquín Rock está entre os destaques. O festival é o Rock’n Rio da Argentina. Pode imaginar a minha alegria quando me contrataram! Ano passado também aconteceu o A Woman’s Blues, um projeto que criei, produzi e executei junto com minhas parcei-ras Camila Dengo e Rhay Santos. A ideia era ter uma banda só de mulheres. Foi surreal. Emoções a flor da pele tanto na plateia quanto no palco. O time era formado por mim, a Rhay e a Camila nos vocais, Karina Comin na guitarra, Débora de Oliveira na harmônica, Dani Ella no baixo, Mari Kerber no piano e, nosso escolhido, Mateus Bicca Sabi na bateria. Mas são diversos momentos. Escolho esses por serem os mais recentes.
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Em pleno início de pandemia, março de 2020, você lançou a faixa Song For Me com contribuição do guitarrista Sasha Z. Como foi essa parceria?
Eu mostrei a música inacabada pro Sasha e ele curtiu demais. Aí, em uma tarde terminamos a composição. É o trabalho autoral que mais me identifico. Sou toda eu naquela música. As gravações fluíram superbem, os músicos compreenderam a ideia que se queria passar, a arte ficou lindíssima, a letra me representava. Tudo 100% até que... pandemia. Estávamos programando o lançamento para abril, com direito a clipe, evento. Não rolou. Quando foi junho achei que não tinha mais porque esperar. Já sabia da gravidade da situação. Lancei somente o single nas rádios e plataformas digitais. E está aí, mais um trabalho do qual me orgulho. Song For Me foi muito bem recebida pelo público e pela mídia.
E como está sendo passar por essa pandemia, já que os eventos estão suspensos?
Ano passado rolaram lives, alguns festivais online, inclusive o Nós Todo Mundo Festival, que produzi junto com a Flávia Vidor e contou com músicos do mundo todo. Também as minhas aulas de Técnica Vocal, Canto e Expressão passaram a ser online, o que continua até hoje. Em termos de criação, o primeiro semestre foi melhor. 2020 não foi nenhum ano sabático, então, claro que o confinamento e o medo da doença me afetaram, e a criatividade deu uma travada. Por isso, na segunda metade do ano, passei a me dedicar mais aos estudos de Pedagogia Vocal. Sigo no mesmo ritmo, sem muitos planos a longo prazo. Prefiro aguardar os acontecimentos e focar no que sei que, por hora, é seguro.
Você cria trilhas sonoras para peças de teatro e, inclusive, conquistou o prêmio no Festival de Teatro de Ibirubá com o grupo Atores Reunidos. Como é esse trabalho?
Lindo (risos), mas hoje, nem o grupo nem a peça existem mais. Atuei com os Atores Reunidos por vários anos. Logo depois que deixei a Lucille passei a fazer parte da trupe. Comecei trabalhando com as trilhas sonoras e depois acabei como atriz, não só dessa peça como de outras que montamos ao longo dos anos de atividade. Tenho saudade dessa época, dos nossos encontros de sábado à tarde na Base, como chamávamos nosso local de ensaio. Foi um tempo muito bom.
Você também é professora de canto. Qual o perfil dos seus alunos e como é a atividade de ensinar?
Eclético! Tem desde criança de oito anos a adultos com mais de 50. Pessoas que querem trabalhar com música, que já trabalham, outras que gostam de cantar e que fazem aulas como uma forma de terapia. Gosto de ensinar. A educação sempre andou lado a lado com a música na minha trajetória. Na realidade, acho até que a educação veio primeiro, ela é musical e parte importante da minha vida. Me realizo ao ver as pessoas entrando em contato com a sua própria voz e descobrindo suas possibilidades. Acredito que o fazer artístico é pra todos que desejam. Se você quer cantar, cante; se quer pintar, então pinte; quer dançar, tocar um instrumento... todos podem, e devem. O mundo precisa que as pessoas estejam mais em contato com seu lado artístico. Isso sensibiliza, humaniza. Procure um professor e realize seu sonho. Isso só faz bem, e transforma.
Quais são os sonhos e projetos da cantora Fran Duarte?
São tantos! Meu maior sonho é morar na praia. Não tem nada a ver com música, eu sei. Mas esse é o top sonho de todos! Mas a cantora também sonha. Quero poder viajar mais com a minha música, levar meu trabalho para mais pessoas. O maior projeto é não parar, me reinventar sempre e continuar criando.