Foto Fabio Grison
Juiz de Direito, Cidadão Caxiense e pioneiro na implementação da Justiça Restaurativa no Brasil, ele agora enfrenta o desafio de dividir a rotina entre Caxias do Sul e Porto Alegre ao assumir a função de desembargador.
Nascido em Capinzal, no oeste do Estado de Santa Catarina, Leoberto Brancher mudou para Porto Alegre aos 14 anos para estudar. Quando chegou o momento de escolher a profissão, focou na inclinação que tinha para as ciências sociais. Apaixonado por história, sociologia e ciência política, lia muito sobre os temas, mas não tinha perspectiva de seguir carreira acadêmica. “Acabei escolhendo o Direito pelo nome do curso na época ‘Ciências Jurídicas e Sociais’, depois descobri que só abordava as questões jurídicas mesmo”, diverte-se.
Assim, ingressou no curso de Direito da UFRGS, e foi ainda durante a faculdade que começou a trabalhar como funcionário do Tribunal de Justiça. Era assessor do tio, o desembargador José Baison, em quem se inspirou e com quem aprendeu muito durante os sete anos que permaneceu na função.
Iniciou a trajetória como juiz em 1990, aos 28 anos, na cidade de Dom Pedrito, mesmo ano em que foi instituído o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Nesse momento descobriu o viés social do Direito. “Comecei a estudar o assunto e me encantei com as promessas de um futuro melhor para crianças e adolescentes que essa lei continha.”
A relação com Caxias
A vinda para a cidade não foi acidental. Brancher buscou a Serra para estar mais próximo de suas raízes. Os quatro avós eram italianos, o pai nasceu em Veranópolis e, a mãe, em Antônio Prado. Então, Caxias era uma espécie de retorno às origens, mas em uma espiral evolutiva. Chegou em 1995 com a missão de instalar a Vara Regional da Infância e Juventude e mostrar que o ECA traria melhorias. Por aqui, lançou o projeto Serra do Futuro para envolver as 14 Comarcas da Região na implementação do estatuto.
O engajamento da comunidade foi muito grande e todos se aliaram a essa promessa de um futuro melhor para os jovens. Foi assim que conheceu Vera Vanin, na época primeira-dama do município e que, formada em Assistência Social, auxiliou no processo. Almoçava com Vera e o então prefeito Mário Vanin todas as terças-feiras, o que considerava um privilégio.
Nesse período, o município fez uma parceria com Blumenau (SC), onde o ECA já estava mais desenvolvido, região do desembargador Antonio Fernando do Amaral e Silva, um dos redatores do estatuto, de quem Brancher se tornou discípulo e amigo. Em 1996, numa viagem de ônibus à cidade catarinense integrando uma comitiva da prefeitura, conheceu a assessora do prefeito Vanin, Denise Fochesato, com quem está casado desde 1998, pouco antes de ser transferido para Porto Alegre, onde atuou como juiz da Vara da Infância e da Juventude por 10 anos. Antes de partir, recebeu o título de Cidadão Caxiense, concedido pela Câmara de Vereadores, em outubro de 1999. Na época, a pessoa mais jovem a receber a honraria.
Na época, Leoberto Brancher foi a pessoa mais jovem a receber o título de Cidadão Caxiense concedido pela Câmara de Vereadores. Foto: Divulgação Câmara de Vereadores
Justiça Restaurativa
O primeiro contato de Brancher com a ideia de Justiça Restaurativa foi durante um curso sobre educação e valores humanos, em janeiro de 1999. O conceito chegou aliado à sua percepção, ao assumir como juiz da Infância e Juventude na capital gaúcha, de que a lei não solucionava os problemas. “Comecei a me questionar: estou aqui para educar ou para punir? É possível ir além? A Justiça Restaurativa, uma ferramenta de controle não violenta e que resolvia os problemas, dizia que sim. E dizia isso para um juiz com 700 jovens presos na Febem”, relembra.
A partir daí, Brancher começou a fazer estudos sobre o conceito, e a primeira aplicação prática aconteceu em 2002, com resultados positivos. Desde então, tornou-se um entusiasta, se envolvendo em diversos projetos para difundir a Justiça Restaurativa pelo país, como é o caso do projeto Justiça para o Século 21, de 2005, iniciativa da Secretaria da Reforma do Judiciário do Ministério da Justiça em colaboração com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento, com projetos-piloto em Porto Alegre, Brasília e São Caetano do Sul (SP).
Veja também:
Em 2009, o juiz retornou a Caxias a fim de estar mais perto dos familiares, além disso, a equipe da prefeitura gostaria de aplicar o modelo de Porto Alegre por aqui. E assim teve início o projeto Caxias da Paz, transformando a cidade em uma das pioneiras na implantação de Justiça Restaurativa como política pública no país. Atualmente, Brancher é coordenador Estadual do programa Justiça Restaurativa para o Século 21 do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, coordenador do Núcleo de Formações em Justiça Restaurativa da Escola da AJURIS e também integra o comitê gestor da Justiça Restaurativa do Conselho Nacional de Justiça. O desafio, agora que foi promovido a desembargador, será lidar com as causas mais jurídicas do que sociais, morando em Caxias e trabalhando em Porto Alegre.
Foto: Fabio Grison
A família
Pai presente, apesar das muitas viagens na agenda, busca participar ativamente da vida das filhas Maitri, 15 anos, e Dhara, 10. Quando está na cidade, não abre mão de almoçar com elas e com Denise. “Ser pai é o melhor ensinamento que tenho sobre o meu modelo de masculinidade e, por extensão, de autoridade. É o desafio de ver a teoria na prática”, define.
Nos momentos de lazer, a prioridade é estar com os familiares e amigos, embora o círculo de amizades e o trabalho como militante social já estejam muito próximos e façam parte até mesmo desses momentos de relaxamento: “Tenho o objetivo de ser em mim a transformação que quero para o mundo.”