Foto Fabio Grison
Ter dificuldades para caminhar não impediu que Emilio Finger tivesse uma vida cheia de emoções. Ele toca violino e violão, foi escoteiro, pratica mergulho, jogou futebol, padle, já pilotou automóveis em pistas de corrida, conheceu mais de 30 países, esquiou no Vale Nevado, no Chile, subiu o monte do Vulcão Etna, na Itália, caminhou 300 Km do Caminho de Santiago de Compostela, na Europa, entre muitas outras aventuras.
Para compreender melhor as experiências desse empresário e palestrante, que já contou sua história de superação para mais de 100 mil pessoas, é preciso conhecer primeiro as batalhas que ele enfrentou, e com alegria, desde a infância.
Primeiros anos
Emilio naseu em 7 de julho de 1963, em Flores da Cunha, durante o auge da pandemia de paralisia infantil no Brasil. Foi o décimo primeiro filho em um total de 15 irmãos.
Aos seis meses de idade, não respondeu à saudação matinal da babá, Lurdes, que todos os dias balançava um terço para Emilio, que se agitava sorrindo e sacudindo os braços e as pernas. Após a visita do médico da família, o diagnóstico foi também confirmado pelos médicos caxienses Henrique Ordovás Filho e Emilio Ataliba Finger, que era cardiologista e avô do menino.
Os pais, Ary e Luiza Finger, e também os irmãos e os tios, uniam esforços para melhorar a qualidade de vida de Emilio. Foram três cirurgias nos tornozelos e joelhos e muitas sessões de fisioterapia para que ele pudesse ter certa mobilidade. Se locomovia se arrastando pelo chão, e os médicos diziam que jamais seria capaz de caminhar. Aos cinco anos, o pai queria comprar para Emilio uma cadeira de rodas, mas foi impedido pela mãe, que sabia que o maior sonho do filho era caminhar, o que de fato aconteceu, com muita persistência e dedicação, cerca de um ano depois.
Até hoje, considera que uma de suas principais qualidades é a adaptação. Por exemplo, sabendo que não conseguiria correr, contou com a ajuda dos irmãos nos treinamentos para aprender a jogar futebol na posição de goleiro. Mais tarde, aperfeiçoou a habilidade com auxílio dos amigos. Dessa forma, deixou de ser o último escolhido na hora de montar os times e, com o tempo, passou a ser um dos primeiros. “Às vezes ganhava e às vezes perdia, mas sempre saía me sentindo vitorioso, pois desafiava meus limites. A derrota não era uma frustração, era uma força para seguir tentando”, completa.
Escola
Na escola, não recebia atenções especiais, era tratado como as outras crianças e fazia as atividades do jeito que conseguia. A partir da segunda série do ensino fundamental, passou a estudar no segundo andar da instituição e era preciso subir e descer escadas. No primeiro dia, na hora do intervalo e ao final da aula, foi empurrado por outras crianças nas escadas, o que fez com que as freiras que administravam a escola dessem a ele permissão para sair alguns minutos antes dos demais.
No dia seguinte, saiu alguns minutos antes e amarrou todos os cadarços dos calçados dos colegas uns aos outros (naquela época, as crianças deixavam os sapatos do lado de fora da sala de aula e calçavam chinelos para entrar na sala). Questionado pela professora sobre o motivo de tal atitude, respondeu a ela e aos colegas que não tinha necessidade de sair antes, queria ser tratado como os demais, mas precisava que os colegas tivessem o cuidado de não empurrá-lo. Com essa atitude, conquistou o respeito dos colegas.
O ensino médio, cursou na escola Santa Catarina, em Caxias, quando ia e voltava de ônibus para casa. “Eu era uma criança muito alegre, e a comunicação era a maneira de evoluir e de me incluir. Sabendo me comunicar fui muito querido pelas outras crianças e professoras no tempo da escola. Era tratado diferente, dadas as limitações, mas ao mesmo tempo de forma muito igual”, conta. Emilio também foi escoteiro, participando de todas as atividades ao ar livre junto com os outros integrantes do grupo. “No início, o pessoal tinha cuidado especial comigo, mas com o tempo viram que isso não era necessário.”
Vocação
Começou a trabalhar por volta dos 17 anos na administração de uma confecção que pertencia aos seus irmãos. A empresa tinha cerca de 40 fuincionários. Por uma decisão ruim, acabou levando o negócio à falência. “Já entrei na administração do negócio percebendo que não tinha muitas habilidades de administrador, mas era um ótimo vendedor.” Teve ainda outras duas tentativas de empreender, revendendo calças jeans, mas ainda não tinha se encontrado profissionalmente.
Depois do casamento, sua mulher não se adaptou morando em Flores da Cunha e, quando ele tinha 25 anos, o casal veio para Caxias. Um ano depois, Emilio celebrava a chegada da filha, Rafaela Finger, que é arquiteta e atualmente mora em Porto Alegre. “Ela chegou em um momento difÍcil, pois eu ainda não tinha me encontrado profissionalmente. Vi que precisava tomar uma atitude, porque a partir daquele momento tinha a responsabilidade de cuidar dela, a coisa mais importante da minha vida”, afirma.
Foi quando a transformação aconteceu. Em 1996 foi convidado a trabalhar na Randon como vendedor de consórcios e descobriu sua real vocação. Se formou no curso de Economia pela Universidade de Caxias do Sul (UCS) e fez uma pós-graduação em Gestão Estratégica de Vendas na Faculdade da Serra Gaúcha (FSG). “Me tornei especialista na área comercial”, define.
Em 2002, assumiu a direção comercial da máster franquia da Racon Consórcios Caxias do Sul, junto com dois sócios. Hoje são quatro sócios e Emilio atua no conselho da empresa.
Tempo livre
Em 2006, após o divórcio, se dedicou com mais afinco a conhecer o mundo. Já visitou mais de 30 países e traz na bagagem experiências fantásticas de qualquer lugar que visita, além de uma coleção de dedais e outros pequenos souvenirs, incluindo artigos de decoração. Apaixonado pela Itália, já foi oito vezes para o país “e quero voltar mais oito“, diverte-se. Nas viagens, gosta de explorar os lugares caminhando.
Caminhar também é o exercício físico que pratica, sempre que pode e que o clima ajuda. Além disso, empenha seu tempo livre a cuidar dos mais de 40 bonsais que mantém na varanda, gosta muito de ler e ver filmes. E, quando é possível, vai até a Ilha do Arvoredo, em Santa Catarina, para praticar mergulho com cilindro.
Agradecimento
Em 2017, o empresário decidiu agradecer ao universo por todas as conquistas de sua vida e, especialmente, por ter conseguido realizar o maior de seus sonhos, o de poder caminhar. Decidiu fazer isso percorrendo nada menos que o Caminho de Santiago de Compostela, um conjunto de percursos de peregrinos situado na Europa, que passa por vários países e chega a Santiago de Compostela, feito desde o século IX para venerar as relíquias do apóstolo Santiago Maior.
Após quatro meses de preparação com musculação e caminhadas ao ar livre, partiu junto com a amiga Leidy Indicatti para mais essa aventura. Dos mais de 800 quilômetros do percurso, cerca de 300 foram feitos caminhando. Mais uma vez negociando com os próprios limites, acreditou que podia e superou desafios. “Me aceitar e me tornar normal mesmo tão diferente foi o que me fez especial”, conclui.
Palestras
Quando cursou a pós, tinha um professor que algumas vezes pedia que Emilio o substituisse. Seu relato acabava sempre encantando os alunos e outras turmas pediam para assistir àquela aula também. Com isso, o professor sugeriu transformar essa experiência em uma palestra e assim surgiu a Gestão do Coração. “Quando vi, estava com quatro turmas juntas, auditórios cheios”, conta. A proporção aumentou tanto que Emilio acabou contratando uma empresa para desenvolver o layout da palestra e também um empresário para administrar a agenda.
Após percorrer o Caminho de Santiago, transformou a nova experiência em outra palestra: Um passo a mais. Em 2019, ministrou 62 palestras e calcula, ao todo, já ter contado sua história para mais de 100 mil pessoas.
Livros
Lançar um livro era mais um desejo do empresário do que de Emilio. “Não me sentia confortável para falar sobre coisas que sequer lembrava”, então, reuniu um time de profissionais que coletaram os depoimentos da mãe e dos irmãos para contar o início da sua história. Assim, em 2017, nasceu a obra Negociando com meus limites.
Para 2021, planeja a autobiografia, na qual pretende abordar a passagem das fases a partir de sua perspectiva, contando como conseguiu encarar a paralisia e transformar algo que as pessoas consideram feio, em algo bonito: “A primeira coisa que as pessoas notam em mim não são as pernas, mas meu sorriso.”