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Teresinha Isabel Rihl Tregansin | Revista Afrodite

Teresinha Isabel Rihl Tregansin

Fotos Fabio Grison

Por Vivian Kratz  

Autora hábil em contar histórias, especialmente com temáticas ligadas ao resgate da trajetória de etnias e causos ocorridos em Galópolis, onde viveu parte da alegre infância, Teresinha Tregansin – Tetê, para os íntimos – soma uma expressiva contribuição ao fomento da cultura na cidade. Natural de Caxias do Sul, graduada em Letras com especialização em História Regional e Literatura Infantojuvenil pela Universidade de Caxias do Sul (UCS), esteve à frente de departamentos culturais e organizações de forma voluntária, promovendo eventos e angariando fundos.
Mais velha de seis irmãos, mãe de três filhos e avó de sete netos, aos 78 anos essa amante das viagens e das artes segue produtiva. Além dos livros, toca acordeão (sem plateia, só para seu deleite) e venceu concurso estadual tendo o conto A Procissão publicado na coletânea Assombros Juvenis V. Para os próximos meses, está prevista a publicação de Kira - A cachorrinha salvadora, história real que terá a renda revertida à causa animal.

Como se deu sua entrada no mundo dos livros?
O primeiro livro publicado foi O dente de ouro – dentistas prático-licenciados nas colônias italianas do Rio Grande do Sul (2000), a partir da conclusão da pós-graduação. A professora Loraine (Slomp Giron) – grande professora, exigente, mas das boas – promoveu um curso de História Regional e me convidou a participar. No final, além da prova, devíamos apresentar uma monografia inédita. Como meu pai, Ivo Arno Rihl, era dentista, prático-licenciado, porque naquele tempo ainda não havia faculdade em Porto Alegre, pensei que, por estar nesse meio, poderia ser um bom tema. Ela achou ótimo. Eu tinha fotografias, pesquisei no arquivo histórico, no museu municipal, e procurei contar a história de pessoas que eram dentistas na época, como faziam para atender – levavam cadeiras desmontáveis para as colônias – e curiosidades como a da única mulher dentista no período (1897 a 1960). Só havia uma, a história está no livro, a sogra cuidava dos filhos e ela atendia. Muitos clientes se acomodavam no porão da casa para aguardar o atendimento. Como o trabalho ficou interessante, inédito em Caxias, a professora sugeriu publicar. Era um ano interessante, 500 anos do descobrimento do Brasil, 125 da imigração italiana, 90 de Caxias como cidade, então consegui pela Lei de Incentivo à Cultura.

E a paixão por escrever surgiu com um elogio na escola?
Foi, foi mesmo. Interessante como um elogio cala fundo. A irmã do colégio de Galópolis, onde estudei, leu um trecho de Eça de Queiroz e pediu que reproduzíssemos. Eu reproduzi, porque tinha prestado muita atenção, e entregamos. Disse que dois dias depois daria o resultado. Neste dia, ela leria a melhor, e leu a minha. E acrescentou: “se Eça de Queiroz ouvisse, ficaria orgulhoso”. Nossa, nunca esqueci, e faz mais de 60 anos. Como faz bem um elogio, no lugar de tanto criticar, se os professores elogiassem mais, acho que daria mais efeito. 

Galópolis sempre foi um tema de seus escritos, não é mesmo? Qual sua ligação com o lugar?
Sempre gostei de Galópolis, onde passei uma infância muito livre, tomando banho de rio. E tem tantas histórias circulando lá, que eu ouvia do pessoal mais antigo, que pensei, “tenho que escrever”. Então, fiz um histórico (que está no livro Galópolis, El Profondo Vale Verde – história, arte e memória, de 2009, do qual é organizadora), só que não sozinha, pois queria fazer algo grandioso, então convidei a Cleudes (Piazza), que ficou bem encantada. Resgatamos informações a respeito dos fundadores, o Hércules Galló, os primeiros moradores. Na noite do lançamento, o próprio José Galló, neto do Hércules, que acaba de passar a superintendência das Lojas Renner, depois de muitos anos, esteve presente. Ele contribuiu escrevendo sobre sua infância. Minha parte ficou sobre a globalização porque, na época, se pensava que as pequenas localidades poderiam desaparecer. No fim, não, elas se firmaram, Bento Gonçalves e Garibaldi passaram a ter o selo de qualidade do vinho, por exemplo... foi o contrário.

Mas seu envolvimento com arte vai muito além da literatura...
Sempre escrevi, mantinha um diário, e meu pai, além de dentista, era sócio de um hotel na praia de Capão de Canoa. Passávamos janeiro e fevereiro lá, num chalé bem próximo. Levava meu acordeão – me formei no curso de Belas Artes, que ensinava a tocar, e eu gostava muito. Naquele tempo o hotel oferecia tudo, café da manhã, almoço e jantar, os hóspedes pediam músicas, dançavam, eu era bem dedicada. Os funcionários também adoravam. Uma influência boa que tive na infância foi que meu pai era assinante da revista Seleções, e tinha um artigo do qual gostava muito chamado Meu Tipo Inesquecível, que trazia uma pessoa que tinha influenciado outra, ou tinha feito um bem para a comunidade, e eu queria ser um tipo inesquecível, queria fazer alguma coisa boa. 

Os livros vieram depois do casamento e dos filhos?
Sim, casei com o Valdir (falecido em 2016) e tivemos três filhos: o Rafael, o Tiago e o Lucas. O segundo e o mais novo ganharam bolsa e fizeram universidade no Tennessee (EUA), em troca jogavam tênis pela faculdade. Tenho três netos americanos, Daniel, Maria Isabel e Marcelo, além do Mateus, que nasceu na Alemanha, e do Gabriel, Frederico e Melissa, que são brasileiros. Uma verdadeira salada internacional. Mas antes da faculdade de Letras fiz vestibular na PUC. A prova era oral, acredita? Passei, e minha surpresa foi ser a única mulher no primeiro ano. Era muito bem cuidada, sempre respeitada, foi um período muito bom, de dia trabalhava no banco, havia passado num concurso, mas me dei conta que não era o que queria. Estava estudando Contábeis e Atuariais. Então voltei e prestei vestibular na UCS. Só que já estava acostumada a ganhar meu dinheiro, já tinha sentido o gostinho. Soube que na revenda Mercedes Benz estavam contratando, fiz um teste, morrendo de medo, e fui admitida. Lá reencontrei o Valdir, que era contador da Brasdiesel. Havíamos dançado uma vez num baile no Guarani. No dia seguinte desse reencontro, que o deixou muito surpreso, ele me mandou rosas, lindas. Deu certo, quatro anos depois estávamos casados. Tínhamos os mesmos gostos, ele também era de família grande, estávamos acostumados a olhar pelos irmãos, então quisemos viajar antes de ter os filhos. Sempre gostamos muito de viajar e tanto o trabalho dele quanto dos filhos oportunizaram esse hobby.

Você se engajou em muitos projetos culturais em Caxias, comunitários, junto aos clubes, ao Núcleo de Artes Visuais (Navi). Como foi esse envolvimento?
Sim, estava grávida do mais velho quando me formei. Passei num concurso estadual para lecionar, mas era em outra cidade e, com criança pequena, resolvemos que eu ficaria até ele crescer mais um pouco. Aí acabei me envolvendo com cultura, o Valdir assumiu a presidência do conselho do Recreio da Juventude e bem mais adiante assumi o departamento cultural do clube. Fazíamos muitas promoções, porque quem promovia cultura até então eram os clubes, não havia muitos lugares para isso. Recebemos Moacyr Scliar e outros escritores, até a Ospa (Orquestra Sinfônica de Porto Alegre), a Orquestra de Câmara do Theatro São Pedro, com a Eva Sopher. Conseguíamos com parcerias o transporte e o jantar, uma época maravilhosa. Depois veio o Núcleo de Artes Visuais (Navi), do qual fui presidente, e a Rita Brugger vice, o que nos aproximou e criou uma afinidade muito grande, tanto que todos os meus livros são ilustrados por ela, e o Conselho da Empresária da CIC, onde somos em 20 integrantes, que recentemente me homenageou com a boneca Tetê, fiquei muito comovida, até dormi com ela naquele dia (risos). Um projeto do qual fiquei muito feliz em participar foi As Teresinhas, para a construção da igreja de Santa Teresinha, no bairro Fátima Baixo.

O terceiro livro publicado, Os Ferozes (2012), foi para o público infanto-juvenil, que deixa uma ideia de que poderá haver uma sequência. 
Deixei um gancho, alguma coisa já escrevi, mas sem previsão de publicação, vai ser uma história de fantasmas, com mais ficção. Cada livro tem um processo de escrita. Os Ferozes foi, digamos, mais fácil, mas durante a produção parecia que as crianças (os personagens) brigavam na minha cabeça pelos papéis, achei que estava ficando maluca (risos). O livro surgiu de uma história que havia em Galópolis de que durante o Estado Novo, quando houve muita repressão, todos os partidos foram fechados e meu pai era um dos dirigentes do PRP (Partido de Representação Popular). Eles usavam umas camisas verdes e quando souberam que poderiam ser presos, enterraram os uniformes e as bandeiras com emblemas na beira do rio. Isso deu o mote para o livro, porque 80 anos depois, um dos netos da Tetê, no caso eu, vai explorar esses acontecimentos. Todos os personagens são da família. É uma história que tem mistério. Levei a Rita (Brugger) pra Galópolis, para ela desenhar as casas, dei fotografia dos netos.

Seu mais recente trabalho, A esperança Cruza os Mares (2015), retrata a imigração polonesa. Por qual motivo a escolha?
Os poloneses são a terceira maior imigração do Rio Grande so Sul, é um número muito grande de pessoas espalhadas em vários lugares e elas deram uma grande contribuição para nossa cultura. Gostei de escrever sobre um povo que passou muito trabalho e se reergueu. Não tenho nenhuma ascendência polonesa, mas muito já foi escrito sobre a imigração italiana e alemã, e existia essa carência. Os descendentes que estão aqui em Caxias costumam se reunir, tem uma casa que acolhe, faz jantares poloneses, é algo interessante e pouco divulgado.

Algum outro projeto no qual esteja trabalhando? Planos para o futuro?
Tenho sim, sobre Galópolis. A ideia é escrever sobre personagens importantes que viveram na localidade, como uma parteira que ia a cavalo nas colônias atender às mulheres, o dono do cinema... uma coletânea de perfis. O livro sobre a cachorrinha Kira, que é uma história real, talvez saia em março. Com dois filhos morando fora e netos internacionais (risos) sigo viajando. Volta e meia um deles vem me buscar para ir a algum lugar. Gostei muito da Suécia, me encantei com o país. Em Estocolmo, visitei a sala onde é escolhido o Prêmio Nobel, que agora também tem sala na Noruega. São muitas histórias.