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Conversa Com Isabel Sebben | Leia mais na Revista Afrodite

Isabel Sebben

Fabio Grison

Inquieta e observadora, ela descobriu suas habilidades para os diferentes tipos de arte ainda criança. A maior delas, no entanto, está em compartilhar o conhecimento e as descobertas com o grupo de pesquisa do seu ateliê. É lá que ela mostra toda sua versatilidade e busca novos desafios todos os dias

Movida a desafios, ela está sempre procurando uma nova aventura no mundo das artes plásticas, mas não para criação própria. A alegria de Isabel Sebben está em passar o conhecimento adiante. Não foi à toa que seguiu carreira no magistério. Formada em Ciências Físicas e Biológicas, na primeira turma da UCS, em 1972, foi professora por 25 anos. Quando se aposentou, em 1997, abriu um ateliê para continuar ensinado e compartilhando conhecimento.
Feliz com a vida, organizou “um festão” para comemorar seus 70 anos, completados em março. “O mais bonito foi toda a família reunida, a confraternização. Não queria ninguém diferente, então fiz todos usarem uma camiseta com a frase Isabel 70 anos.”
Casada com Mário Guilherme Sebben há 47 anos, tem três filhos e quatro netos. Temos o Rafael, pai da Maria  Eduarda e da Ana Carolina, o Guilherme, pai do João e do Pedro, e o Eduardo, que ainda não tem filhos e está morando no Rio de Janeiro. “Uma família que me faz muito feliz.” 

Você tem um ateliê onde ensina/compartilha os mais diferentes tipos de arte e artesanato. Como funciona essa mistura de técnicas e estilos? 
Chamo de grupo de pesquisa, pois é composto por várias artistas plásticas, então, não me considero a professora, sou a pessoa que complementa. Trabalhamos com tinta comum, a de pintar paredes, acrílica para trabalhar com telas, aquarela, escultura, vai depender daquilo que se está procurando. O diferente nessa jogada é que passo um grande grau de informação às participantes, porque pesquiso muito antes que cada uma crie seu trabalho. Procuro sempre pesquisar para poder ajudar a tornar a pessoa mais conhecedora sobre determinado assunto. E nossos grupos já participaram de várias exposições. A primeira que organizamos foi no Recreio da Juventude, expondo vacas pintadas. Depois surgiram manequins pintados, expostos na Arte Quadros, móveis pintados e até vasos pintados. 

O que motivou a abertura do ateliê? 
Quando me aposentei, abri o atelier. Começou com duas alunas e agora tenho 24, divididas em três turmas. Trabalhei a vida inteira na Escola Santa Catarina como professora de Ciências para alunos da 8ª série, foram 25 anos, e nesse meio tempo também trabalhei com arte. Vi que tinha muita capacidade de explorar aquilo que estava dentro de mim e queria passar para outra pessoa essas habilidades, porque sou muito rápida na maneira de criar. E o ateliê é todo montado para eu passar uma tarde agradável com ótimas companhias.

E como a arte surgiu na sua vida? 
Descobri minha veia artística ainda criança. Uma vez, com uns 12 anos, peguei argila e fiz uma escultura do rosto do meu pai. Meus Deus, ficou horrível, mas eu achava que era parecida com ele e dei como presente de Dia dos Pais. Foi uma emoção para mim e, com certeza, para ele também. Mas só comecei a percebê-la melhor quando, como professora de Ciências, eu desenhava no quadro negro. A partir disso, vi que eu tinha um talento... não sei se é talento ou é o tempo que aperfeiçoa as habilidades, porque acredito que todas as pessoas desenvolvem a criatividade na observação, se não observa, não cria arte. A partir daí fiz vários cursos. Comecei pintando porcelana com a Isalina Brustolin, com a Nair Hoffmann, fiz cursos de desenho, aquarela no Navi (Núcleo de Artes Visuais de Caxias do Sul). Tive uma série de professoras que me ajudaram. Também ia sempre a Buenos Aires, Montevidéu, São Paulo, na Casa do Restaurador, procurar técnicas novas. Sempre quis aprender mais, e a técnica nada mais é do que empregar um produto pra ver seu resultado, adicionando tintas, vernizes. As técnicas sempre me proporcionaram um bem-estar muito grande.

O que a arte e o artesanato representam pra você? 
Não sou uma artista plástica, não vendo. A arte não é meu meio de subsistência. É uma observação do que tenho na minha frente, é uma emoção. Se eu pintar minhas mãos com tinta, retrocedo aos tempos das cavernas, é uma arte. Mas é preciso conhecer para definir o que é arte para si. Como se pode dizer que arte contemporânea é maravilhosa se não se sabe quem é o artista, que produtos ele usou e o que ele já passou para chegar até aqui? Eu digo gosto, não gosto, sinto, não sinto, mas tudo vai depender da bagagem que tenho para definir uma arte. Então, arte para mim é emoção. 

Como foi a Isabel na infância?
Sempre tive meus complexos por ser sardenta, me chamavam de enferrujada na escola e isso atrapalhava a minha vida. Mas escutava sempre do meu pai algo que nunca esqueci. Ele dizia ‘Minha filha, o que importa é o que você faz com as mãos.’ Meu pai sempre me passava essa segurança de trabalho. Quando derrubava coisas, quebrava coisas, porque eu era muito agitada, meu pai dizia ‘Tu tem um círculo de energia ao redor de ti, e esse círculo de energia faz com que tu seja diferente de muitas pessoas.’ Então, sempre me imagino com um círculo de energia, meus trabalhos não me deixam insegura porque sei que tenho esse círculo que me protege.

Qual seu maior desafio nessa caminhada pela arte?
Uma vez o frei Celso Bordignon me disse: ‘Isabel, tu não é pessoa de pintar ícone (imagem sagrada) porque tu é muito agitada. Então, apareceu um curso num mosteiro, em Porto Alegre, e eu me inscrevi, era com uma professora italiana. Quando cheguei lá descobri que era um curso de 10 dias, fechada, com oração, comendo pouco. Imagina eu rezando de manhã, jejuando, fazendo a prece iconográfica... Achava que sabia tudo, levei uma caixa de pincéis e, no dia seguinte, na hora do curso – tinham apenas seis pessoas – começou a meditação para depois iniciar o trabalho, e eu achando que era a suprassumo comecei a pintar, foi quando a artista passou por mim e disse ‘Não, não. Apaga tudo e faz de novo”. Trabalhar com ícone é muito difícil, a madeira tem que ser muito preparada e é preciso uma concentração muito grande. No segundo dia eu queria ir embora. Liguei para o meu marido e avisei que não ia ficar até o fim. Ele me disse ‘Já está caindo fora? Nem começou, olha o desafio’. Fiquei os 10 dias. Quando cheguei em casa com meu ícone, meus filhos olharam e falaram ‘Todo o sofrimento pra nos apresentar isso?’ Para realizar o trabalho com ícones é preciso muita espiritualidade para aceitar as técnicas utilizadas no processo. Quando o padre colocou o ícone em cima da mesa, abençoou e carimbou como verdadeiro eu chorei muito, e as pessoas não entendiam o porquê. Mas é emocionante... e são esses desafios que encontro pela frente. 

Você tem uma coleção de peças de São Francisco de Assis. Como ela começou?
Há 16 anos, quando minhas irmãs e eu estávamos na Bahia, vi um senhor esculpindo um São Francisco na cerâmica. Achei o trabalho muito interessante, trouxe a peça para Caxias e a partir dali comecei a estudar o santo. Se reparar, todos os pintores retratam São Francisco com animais em volta, porque a pessoa humilde, uma das principais características atribuídas a ele, gosta de ter animais como companhia. Mas nas exposições mais significativas e recentes de arte sobre São Francisco, em Belo Horizonte e no Rio de Janeiro, ele foi retratado com caveiras. Elas demonstram que não se é nada, no fim vamos ser apenas uma caveira, a única coisa que levamos é o bem que fazemos aos outros. São Francisco adorava tanto Cristo que dois anos antes de morrer ele rezou ‘Eu quero ter o teu sofrimento’ e, então, ficou com os estigmas de Jesus. O verdadeiro São Francisco tem que ter chagas nas mãos e nos pés. Passar essa habilidade de observação para os meus grupos no atelie me dá uma enorme alegria.

Quantas peças e quem compõe a exposição?
A coleção tem 138 peças. São pinturas, esculturas em diversos materiais e de diferentes artistas. Algumas eu ganho de presente, outras compro, e há também uma ou outra peça minha. Tenho uma imagem de 172Kg, que veio do interior de Pernambuco e chegou inteira aqui em casa. Cada uma tem um significado diferente para mim. Um dia ainda penso em realizar uma exposição com essas peças. 
Você é a idealizadora e coordenadora do bazar Criando com Arte, um evento social que há 19 anos acontece no Recreio da Juventude. Como essa ação nasceu?
Concentro todas as tarefas do bazar, só não lido com o dinheiro. É uma parceria com a Confraria Esmeralda do Recreio da Juventude, um grupo de 14 senhoras que trabalha para o bem-estar da comunidade. O Criando com Arte nasceu há 19 anos, quando observei que haviam muitas pessoas em Caxias que trabalhavam com arte decorativa, mas não tinham onde expor. Então pensei numa forma de mostrar o que temos de melhor nessa área e, ao mesmo tempo, ajudar uma entidade, o que faz com que os artistas trabalhem até melhor, cresçam e aperfeiçoem suas técnicas. Hoje participam 80 expositoras com as mais diferentes artes. Para se credenciar ao bazar, a entidade precisa apresentar uma proposta e, depois de escolhida, mostrar como foi aplicado o dinheiro. Ano passado foi muito lindo, com o tema Metamorfose - Borboletas. Meu grupo pintou 24 borboletas de ferro, que foram doadas para o Lar São Francisco de Assis, juntamente com uma imagem do santo. Fomos lá e também fizemos todo o paisagismo do lugar com as borboletas. Neste ano, o bazar vai ocorrer nos dias 14 e 15 de dezembro, trazendo o tema Verde que te quero verde, numa relação aos problemas da Amazônia e ecológicos que enfrentamos, e a entidade beneficiada será o Centro Espírita Alunos do Bem.

Como você avalia a arte em Caxias do Sul? 
De um jeito triste, porque não conseguimos fazer com que as pessoas estudem arte, se dediquem a ela. Pesquisa quantas escolas levam os alunos às galerias de arte, desenvolvem a arte? Onde podemos realizar um curso de arte sem pagar um valor alto aqui em Caxias? Não existe. Precisamos de ateliê livre, mas isso já envolve política e dinheiro público. Precisaríamos ter várias entidades que oferecessem cursos de arte para crianças e adolescentes. Mas acho que não é uma falta apenas de Caxias e região, é algo que existe em todo Brasil. Falta desenvolver a sensibilidade artística. 

E até onde vão os desafios pela arte?
Eu não pretendo parar. Meu plano é descobrir que tipo de trabalho eu ainda vou fazer. Isso é a minha felicidade. Atualmente estou estudando a arte encáustica, os trabalhos feitos com cera de abelha. Como ainda estou em fase de pesquisa, não sei onde vai me levar. Mas ainda quero ter muitos desafios na minha vida.