Quem não lembra da crença disseminada por décadas de que comer de três em três horas é a melhor forma de se alimentar? Pois era, isso mesmo, no passado. Atualmente sabe-se que não comer por longos períodos não prejudica a saúde, muito pelo contrário. Especialistas do mundo inteiro defendem o jejum intermitente (JI), quando acompanhado por um profissional, como a maneira mais saudável para manter a saúde e ainda aumentar a longevidade.
Tudo teve início em 2016, quando o biológo japonês Yoshinori Ohsumi conquistou o Nobel de Medicina e Fisiologia. Nos seus estudos, apresentou a seguinte afirmação: “quem faz jejum vive por mais tempo”. A partir daí, a prática começou a ser bastante discutida e, como não poderia deixar de ser, gerou muita polêmica, conta a nutricionista clínica funcional, Juliana Urtassum Schmitt.
A especialista lembra que a restrição temporária de alimento não é novidade na espécie humana, mas uma prática antiga da civilização, realizada por necessidade (falta de alimentos) e também por questões religiosas. “Historicamente falando, podemos dizer que nosso organismo, por milhares de anos, foi adaptado a ficar longos períodos sem alimentação.” Salienta, porém, que o jejum intermitente (intermittent fasting) não é uma dieta, mas justamente o oposto: “É o ato de não comer por um determinado período de tempo, quando algumas refeições são ‘puladas’ de forma planejada e orientada por profissional especializado. Podendo ser realizado por 12h, 16h e até 24h.”
Além disso, há várias formas de seguir a restrição alimentar, que deverá ser analisada de acordo com as características e rotinas de cada pessoa. De forma geral, os especialistas indicam reservar algumas horas do dia, preferencialmente à noite, das 19h às 7h, por exemplo, para não comer. E não precisa ser todos os dias, pode-se escolher dois ou três na semana.
Benefícios para corpo e cérebro
Além do emagrecimento, que costuma ser o principal motivador para mudar o que, quanto e quando se coloca no prato, os benefícios da restrição alimentar vão muito além. Mark Mattson, chefe do Laboratório de Neurociência do Instituto Nacional de Envelhecimento e professor na Universidade Johns Hopkins (EUA), é categórico ao afirmar que ficar longos períodos sem comer traz benefícios gigantescos para o cérebro, comparando-os aos das atividades físicas para o corpo. Seus estudos mostram que a redução alimentar e calórica aumenta a produção de fatores neurotróficos que promovem o crescimento de neurônios, melhorando a conexão entre eles e dando mais força para as sinapses (zonas ativas do cérebro).
As consequências do JI têm interferência direta na manutenção da saúde. Segundo estudo publicado no site científico The American Journal of Clinical Nutrition, a prática está associada à redução de doenças cardiovasculares e câncer, e auxilia no tratamento de diabetes. Ouras análises revelaram que, além de proteger o sistema imune, é capaz de regenerá-lo, eliminando as células velhas, que já não trabalham corretamente. Então, quando se volta a comer, novas são criadas.
Além da melhora da saúde mental pela ativação da proteína cerebral BDNF (fator neurotrófico), Juliana destaca outros também de grande importância:
Para colher resultados
A palavra mais adequada para colher os benefícios da restrição alimentar é a adaptação, segundo a especialista. “Inicialmente a prática do jejum parece maluca e impossível, por isso, a preparação física e psicológica é importante.” Outro dado relevante é que não existe distinção específica entre homens e mulheres no programa, “as diferenças serão individuais e personalizadas”. Ou seja, a indicação é para ambos os sexos, desde que sejam pessoas saudáveis, possuam uma alimentação balanceada e de qualidade, primeira dica de Juliana, e que pratiquem atividade física regularmente.
Durante o JI é preciso manter uma boa hidratação, ingerindo água, chás e cafés sempre puros. Depois, a indicação é comer de forma equilibrada e orientada. Mas é bom repetir: os benefícios só são reais quando há o acompanhamento profissional. Parar de comer sem orientação adequada pode levar a uma deficiência de nutrientes e vitaminas, e o resultado será o oposto do que se quer, certo?
Quem pode e quem não pode
Apesar dos inúmeros benefícios, a prática do jejum intermitente não é para todos, alerta a nutricionista. Pessoas com doenças crônicas, em uso de medicamento, mulheres grávidas ou que estejam amamentando, diabéticos, que tenham algum transtorno psicológico relacionado à comida ou muito ansiosas não devem utilizar-se dessa prática.
E o mito das três horas?
Com tantos pontos positivos do JI não tem como deixar de questionar sobre a quase verdade absoluta propagada aos quatro ventos do comer de três em três horas... para ajudar o metabolismo e emagrecer. Juliana explica que ela já não é mais indicada para todos. “Algumas pessoas até podem se beneficiar dessa frequência alimentar, porém cada vez mais se sabe que as orientações nutricionais e de hábitos de vida em geral devem ser personalizadas e individualizadas.”
Para o neurocientista Mark Mattson, a explicação é simples: é bom para os negócios. Ele afirma que tanto a indústria farmacêutica quanto a alimentícia não pouparam esforços para difundir a informação e, assim, lucrar com ela. O raciocínio é que, com a prática do jejum, seríamos mais saudáveis, portanto, não precisaríamos de tantos remédios, e comeríamos menos, especialmente alimentos de consumo rápido, como barrinhas e lanches, reduzindo o lucro no setor.
Fonte: Afrodite 47